Publicação Mensal Interna da Papaiz – Edição LI – Outubro 2020
O termo Queratocisto Odontogênico foi utilizado pela primeira vez em 1956 e posteriormente, a designação “queratocisto” foi usada para descrever qualquer cisto maxilomandibular onde a queratina era formada em abundância – logicamente, existem outras características histológicas que são particulares ao queratocisto e são responsáveis pelo seu comportamento biológico.
Devido ao seu potencial de expansão, por ser altamente recidivante e, principalmente, por conter mutações no gene PTCH, em 2005, a OMS passou a utilizar o termo “tumor odontogênico queratocístico”. Neville, em 2009, publicou que a mudança da nomenclatura se baseou em alguns estudos que mostraram que o Queratocisto Odontogênico (QO) compartilha aspectos genéticos moleculares com certas neoplasias. À época, a maioria dos patologistas acreditava que não havia evidência científica suficiente para justificar a alteração de nome – o que causou confusão generalizada na comunidade científica.
Na mais recente classificação de Tumores da Cabeça e Pescoço, publicada pela Organização Mundial da Saúde, em 2017, o antigo Tumor Odontogênico Queratocístico volta ser nomeado como Queratocisto Odontogênico (QO).
Um artigo publicado pela International Journal of Oral & Maxillofacial Surgery em 2018, cujo título é “Keratocystic odontogenic tumour has again been renamed odontogenic keratocyst” salienta que reutilização do termo “queratocisto odontogênico” remete a um tipo de lesão com menor severidade, e que apesar de benigna, é localmente agressiva.
Um dado importante, de acordo com Tolentino (2018): um tumor continua a evoluir mesmo depois que o estímulo que o produziu seja removido. Neoplasias não regridem espontaneamente. No entanto, existem relatos de QOs que regrediram completamente após descompressão.
Discussões de nomenclaturas à parte, existe um consenso geral de que o QO surge a partir dos restos celulares da lâmina dental. O QO apresenta revestimento externo delgado e friável, dificultando sua enucleação completa – o que explica seu potencial recidivante (em torno de 30% dos casos). Alguns cirurgiões recomendam a realização de osteotomia periférica da cavidade óssea (margem de segurança); outros sugerem a cauterização química após a remoção do cisto.
Os Queratocistos Odontogênicos podem ser encontrados em pacientes com idade variável; em 60% dos casos, afeta indivíduos entre 10 e 40 anos, com discreta predileção pelo gênero masculino. Os locais mais acometidos são: região de terceiro molar inferior/trígono retromolar, ângulo e ramo da mandíbula. Pequenas lesões costumam ser assintomáticas, sendo descobertas de forma incidental; as de maiores dimensões podem estar associadas a dor, edema, drenagem e parestesia do lábio inferior.
Por meio de métodos radiográficos e tomográficos, o Queratocisto Odontogênico mostra-se radiolúcido/hipodenso com margens bem definidas e corticalizadas (halo radiopaco/hiperdenso), com deslocamento de reparos anatômicos; 60% dos casos são uniloculares. Podem promover lise óssea dentro da cavidade medular – o que implica em um crescimento da lesão no sentido antero-posterior, sem causar aumento de volume no sentido vestíbulo-lingual. O afastamento de raízes pode ser visto, porém, a reabsorção radicular não é comum. O diagnóstico diferencial inclui o cisto dentígero, ameloblastoma e também o cisto residual inflamatório.
Ao lado direito, nota-se imagem radiolúcida, de limites definidos e corticalizados, unilocular em terço posterior do corpo e processo alveolar da mandíbula, trígono retromolar e ramo da mandíbula, em proximidade ao ângulo da mandíbula – há relação de contato com as raízes dos elementos 48 e 47 e perda de definição do trajeto do canal da mandíbula e de parte do forame da mandíbula. Nota-se rompimento da cortical do bordo anterior do ramo da mandíbula. Queratocisto Odontogênico.
Do lado esquerdo, observa-se imagem radiolúcida, de limites definidos, corticalizados, multilocular, em região de trígono retromolar e quase toda extensão do ramo e processo coronóide da mandíbula, em proximidade com a região de o ângulo da mandíbula, assim como processo condilar da mandíbula.
Imagem hipodensa (A), de limites definidos, corticalizados em terço posterior do processo alveolar e corpo da mandíbula, bem como em trígono retromolar do lado direito. Há rompimento da cortical da crista óssea alveolar e do trígono retromolar, com adelgaçamento das corticais vestibular e lingual (sem aumento de volume das mesmas) e deslocamento do trajeto do canal da mandíbula. Como hipótese de diagnóstico temos: Queratocisto odontogênico.
Referências Bibliográficas
-Santosh ABR. Odontogenic Cysts. Dent Clin North Am. 2020 Jan;64(1):105-119. doi: 10.1016/j.cden.2019.08.002. Epub 2019 Oct 18.
-Tolentino ES. Nova Classificação da OMS para tumores odontogênicos: o que mudou? RFO, Passo Fundo, v. 23, n. 1, p. 119-123, jan./abr. 2018
-Stoelinga PJW. Keratocystic odontogenic tumour (KCOT) has again been renamed odontogenic keratocyst (OKC). Int J Oral Maxillofac Surg. 2019 Mar;48(3):415-416. doi: 10.1016/j.ijom.2018.07.020. Epub 2018 Aug 23.
-Capella LRC, Simoes AYR, Oliveira RJ in: Cabeça e Pescoço. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017. Capítulo 7 (Complexo Maxilomandibular e Lesões Odontogênicas). Pags. 343-382
-Papaiz EG, Capella LRC, Oliveira RJ. Atlas de Tomografia Computadorizada por Feixe Cônico para o Cirurgião dentista. São Paulo: Editora Santos, 2011. Capítulo 8 (Tumores Odontogênicos). Pags. 105-122.
-Neville B [et al.] Patologia oral & Maxilofacial. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. Capítulo 15 (Cistos e Tumoes Odontogênicos). Pags 679- 741