Outubro/2022 – Cisto Ciliado Cirúrgico – LXIX

postado em: Editorial | 2

Por Juliane Pirágine Araujo

Pela Nova Classificação de Tumores de Cabeça e Pescoço da OMS

A 5ª edição da Classificação de Tumores de Cabeça e Pescoço da Organização Mundial da Saúde (2022) apresenta importantes atualizações. O cisto ciliado cirúrgico não é uma entidade nova, mas foi adicionado na classificação dos cistos dos maxilares.

O cisto ciliado cirúrgico é um cisto não odontogênico raro, revestido por epitélio respiratório como resultado da implantação traumática de células do seio maxilar (ou mucosa nasal) em sítios do processo alveolar da maxila ou mandíbula. Acomete principalmente indivíduos entre a 5ª e 6ª décadas de vida, sem predileção por gênero. Como indica a definição, ocorre mais comumente na região posterior da maxila, sendo muito raro na mandíbula devido à implantação de epitélio sinusal por instrumentos contaminados. A história de cirurgia prévia é um critério essencial para o diagnóstico.

Essa lesão é rara, mas localmente agressiva e pode ser uma complicação após cirurgias de implantes dentais, procedimentos no seio maxilar (como levantamento de seio), osteotomias do terço médio da face, exodontias traumáticas, cirurgias ortognáticas e fraturas maxilares. Acredita-se que várias etapas estejam relacionadas ao desenvolvimento da patologia: 1) aprisionamento da mucosa do seio maxilar na ferida por um procedimento cirúrgico; 2) processo inflamatório que induz alteração cística da mucosa respiratória aprisionada; e 3) expansão do cisto pela diferença osmótica do tecido circundante. As citocinas das células inflamatórias estimulam a proliferação do epitélio ciliado aprisionado, o que poderia ocorrer anos após a cirurgia do seio maxilar. O tempo médio de desenvolvimento do cisto após o procedimento cirúrgico é estimado em 18 anos (variando de 4 a 49 anos), podendo ser acompanhado de dor, desconforto ou edema, seja nas áreas adjacentes intra ou extrabucais. Os cistos ciliados cirúrgicos, em geral, podem aumentar e expandir com o tempo, resultando em defeitos ósseos, adelgaçamento e rompimento das corticais do seio a ponto de simular um processo maligno.

A característica radiográfica do cisto ciliado cirúrgico é uma radiolucência/hipodensidade unilocular bem definida. O cisto pode ser envolvido por uma área de esclerose e quando se expande, a parede sinusal adjacente pode tornar-se adelgaçada e rompida. Embora seja geralmente unilocular, variantes multiloculares também foram descritas. O diagnóstico diferencial inclui cisto residual, queratocisto odontogênico, ameloblastoma, fibroma odontogênico, granuloma central de células gigantes, bem como lesões fibro-ósseas.

Uma revisão da literatura atual sobre os cistos ciliados cirúrgicos associados ao levantamento do seio maxilar, mostra a importância da conscientização dos cirurgiões-dentistas sobre essa possível complicação no cenário de um procedimento cirúrgico realizado com frequência na pratica odontológica.

Figuras:

Caso 1: A. Radiografia panorâmica recortada mostrando uma radiolucência unilocular na maxila do lado esquerdo. Paciente apresentou histórico de exodontia traumática na região. B. Cisto inteiramente revestido por epitélio respiratório (H&E; x100).

Fonte: Soluk-Tekkesin M, Wright JM.

Caso 2: A. Reconstrução panorâmica recortada mostrando uma radiolucência unilocular na região posterior da maxila bilateral. B. Cortes sagitais mostram o abaulamento e adelgaçamento das corticais ósseas. O paciente apresentou histórico de levantamento do seio maxilar há 2 anos.

Fonte: Adrian Kahn; Shlomo Matalon; Rahaf Bassam Salem; Lazar Kats; Liat Chaushu; Marilena Vered; Eyal Rosen.

Caso 3:  A. Reconstrução panorâmica recortada mostrando uma radiolucência unilocular na região anterior da maxila. B. Cortes sagitais mostram abaulamento e rompimento das corticais ósseas. Paciente apresentou histórico de um mixoma na região há 22 anos.

Fonte: Imagens gentilmente cedidas pelo Dr André Caroli Rocha.

Referências

Adrian Kahn; Shlomo Matalon; Rahaf Bassam Salem; Lazar Kats; Liat Chaushu; Marilena Vered; Eyal Rosen; (2021). Sinus Floor Augmentation—Associated Surgical Ciliated Cysts: Case Series and a Systematic Review of the Literature. Applied Sciences. doi:10.3390/app11041903

Peighoun M, Samieirad S, Mohtasham N, Tohidi E, Moeini S. Surgical Ciliated Cyst of the Posterior Maxilla in an Old Male, Mimicking Residual Cyst or Odontogenic Keratocyst: A Case Report. World J Plast Surg. 2022 Mar;11(1):132-137. doi:10.52547/wjps.11.1.132

Soluk-Tekkesin M, Wright JM. The World Health Organization Classification of Odontogenic Lesions: A Summary of the Changes of the 2022 (5th) Edition. Turk Patoloji Derg. 2022;38(2):168-184. doi: 10.5146/tjpath.2022.01573

Vered M, Wright JM. Update from the 5th Edition of the World Health Organization Classification of Head and Neck Tumors: Odontogenic and Maxillofacial Bone Tumours. Head Neck Pathol. 2022 Mar;16(1):63-75. doi: 10.1007/s12105-021-01404-7

Yiu Yan Leung; Wing Yan Wong; Lim Kwong Cheung (2012). Surgical Ciliated Cysts May Mimic Radicular Cysts or Residual Cysts of Maxilla: Report of 3 Cases. J Oral Maxillofac Surg.

70:e264-e269. doi:10.1016/j.joms.2011.12.022

2 Responses

  1. Pricila Buhrer

    N arealidade não é um comentário, mas sim uma indagação:
    Essa patologia poderia ser também desenvolvida a partir da instalação de miniimplantes extraalveolares, tipo IZC, infraziogomático?
    Atualmente são bastante indicados e utilizados como ancoragem esquelética em tratamentos ortodônticos.

    • Juliane Pirágine Araujo

      Prezada Dra Pricila,
      Apesar de haver pesquisas que demonstrem perfuração do seio maxilar pelo mini implante, não encontramos relatos com a associação com o cisto ciliado cirúrgico.

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